
Moraes vota por condenar a 14 anos Débora Rodrigues, por pichar "perdeu, mané" em estátua do STF. (Foto: Joedson Alves/Agência Brasil; Débora Rodrigues/Arquivo Pessoal)
“Rosa, ó pura contradição, prazer de ser o sono de ninguém sob tantas pálpebras.”
(Rainer Maria Rilke).
Cacoal, RO - Ao sair da missa deste último domingo, tateei meus bolsos e descobri que havia perdido a chave de casa. Refiz o caminho entre a igreja e meu prédio — moro a apenas alguns metros da paróquia —, percorri o caminho entre os bancos de madeira e o altar, perguntei ao padre, ao zelador e aos ministros da eucaristia, mas não encontrei a chave.
Como sabem os meus sete leitores, não costumo acreditar em meros acasos. Durante os últimos dias, estive pensando em alguém que não pôde voltar para casa: Débora Rodrigues dos Santos, a cabeleireira e mãe de família que o Imperador Calvo condenou a 14 anos de prisão por manchar de batom aquela horrível estátua do STF na fatídica tarde de outro domingo, 8 de janeiro de 2023.
A condenação de Débora — bastante provável se levarmos em conta a subserviência do Soviete Supremo a seu monarca — significa que o Brasil perdeu a chave e está condenado a não voltar para casa
Enquanto esperava meu sogro trazer uma cópia da chave (Seu Lourenço sempre me socorre nessas situações), lembrei-me de uma jovem alemã chamada Sophie Scholl, condenada em 1943 pelo juiz Roland Freisler à pena de morte.
Se o crime de Débora foi manchar uma estátua com batom (dano revertido com água e sabão no dia seguinte) e protestar contra o golpe socialista de 2022, o crime de Sophie foi ajudar a escrever e distribuir um panfleto mimeografado contra o regime nacional-socialista da Alemanha.
Também foram condenados à morte o irmão de Sophie, o estudante de medicina Hans Scholl, e mais três jovens que faziam parte do grupo de resistência pacífica Rosa Branca (considerado uma organização golpista pelo juiz Freisler).
O magistrado escreveu em sua sentença:
“Os réus incitaram a população, por meio de panfletos, a sabotar o armamento e destituir o nosso povo de seu estilo de vida nacional-socialista, propagando ideias derrotistas e ofendendo o Führer da maneira mais traiçoeira possível e, portanto, favorecendo o inimigo do Reich e corrompendo nossa força militar. (...)
Assim, para que o Tribunal do Povo proteja o povo combatente e o Reich, só existe uma pena justa: a pena de morte.
Por sua traição ao nosso povo, os réus serão privados de seus direitos civis para sempre.
Por serem condenados, os réus também devem arcar com as custas do processo.”
Por decisão do juiz calvo do Reich, Sophie Scholl foi guilhotinada em 22 de fevereiro de 1943. Tinha 21 anos.Sophie Scholl não foi a única vítima de Roland Freisler. Mais de 5 mil pessoas tiveram as suas vidas destruídas por decisão do juiz nacional-socialista.
14 rosas para Débora
E agora eu penso em você, Débora, Rosa Branca do Brasil, símbolo e presságio de toda a maldade e injustiça que está sendo preparada contra os dissidentes do atual regime.
Para cada um dos 14 anos a que você foi condenada, eu lhe oferecerei uma rosa.
1. A rosa da justiça: para que o senso de proporções e as leis naturais sejam restauradas. Se você está presa, tudo é permitido.
2. A rosa da liberdade: para que o crime de pensamento um dia seja apenas uma lembrança ruim.
3. A rosa da compaixão: para que o seu drama atinja o coração dos que não pensam como você.
4. A rosa da verdade: para que o império da mentira seja desmascarado.
5. A rosa da bondade: para que as vozes de seus filhos, de sua irmã e de sua mãe sejam ouvidas.
6. A rosa da beleza: para que a feiura — como a da estátua que você manchou — deixe de triunfar no mundo.
7. A rosa da coragem: para que os brasileiros não percam essa virtude que fundamenta e permite todas as outras.
8. A rosa da fé: para mostrar ao mundo o poder da oração.
9. A rosa da família: para que você volte àqueles que ama.
10. A rosa da vitória: porque o mal não terá a última palavra.
11. A rosa da memória: para que a sua história jamais seja esquecida ou apagada.
12. A rosa do tempo: porque ele é a substância da nossa vida neste mundo, e revelará toda a verdade.
13. A rosa da esperança: porque é necessário esperar a redenção, mesmo quando tudo parece perdido.
14. A rosa do perdão: porque ele é a lei estrutural do universo.
Débora, Rosa do Branca do Brasil, milhões de pessoas estão rezando por você. Receba essas rosas como sinal da dor que estamos sentindo por essa injustiça suprema.
Um dia, a gente vai encontrar a chave e voltar para casa.
Fonte: Por Paulo Briguet